A distinção ou Bourdieu aplicado ao estudo do mandarinato chinês

"Há uma noção que, segundo Jean-François Billeter, desempenharia um “papel fundamental no pensamento mandarinal”: é aquela da “vulgaridade” (su), que permite distinguir o homem superior de todo o resto, e, portanto, o mandarim do vendedor ou de qualquer outra pessoa ignorante e engajada na busca do lucro. Ora, este termo, su, é constantemente usado para marcar a distinção no próprio seio do mandarinato: distinção entre a inspiração elevada do “funcionário confuciano” e o pragmatismo do funcionário eficaz, mas “ordinário” (uma das traduções de "su"), entre o engajamento idealista e o carreirismo ou a indiferença, entre a integridade altiva e a obsessão do lucro, e assim por diante. E também, em um plano mais mundano, mas não menos importante, entre aqueles que têm maneiras e aqueles que não as têm. O que eu chamo aqui de maneiras é toda a coreografia social e mesmo corporal (diz-se, em geral, a etiqueta) consignada nos manuais de ritual, mas que as pessoas bem-nascidas interiorizaram desde sua infância. Mas é, também, uma infinidade de convenções relacionadas à linguagem, ao vocabulário, ao estilo epistolar, às formas de tratamento, às alusões literárias e todo tipo de coisa; é, ainda, o senso do estilo, de fato o senso estético, que permite revestir com elegância os atos menos recomendáveis da vida cotidiana dos mandarins, tais como solicitar um favor ou uma propina".
 
Pierre-Étienne Will, "La distinction chez les mandarins". In: BOUVERESSE, J. & ROCHE, D. (éds). "La liberté par la connaissance - Pierre Bourdieu, 1930-2002". Paris: Odile Jacob, 2004, pp. 230-231. [tradução minha]

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

VERMELHO, BRANCO E SANGUE: O TERROR BRANCO E O GRANDE MEDO, 1789-2021, por Beatrice de Graaf

4 LIÇÕES EXEMPLARES DA REVOLUÇÃO FRANCESA PARA OS DIAS ATUAIS, por Christine Adams

As Américas, comércio armado e energia barata: resenha de “A Grande Divergência”, de Kenneth Pomeranz, por Branko Milanovic